Daqui, vejo a dança sobre o fio de um trapézio, inaugurando significados.
Um vulto balança em desalinho, exibindo cicatrizes de uma dor que não existe.
Vejo os farrapos onde o silêncio passou,
a morte, desacreditada, presa à parede.
Ela acena-me, desdenhosa:
“Olha como me visto de neutro em verdade opaca.”
Emudeço, avessa ao abandono infantilizado
e à agressiva cor da solidão.
Sem previsão, deixo fluir —
sei que a rejeição é um rio sem nome,
e essa parte é a inevitável consequência.
Sou a observadora que olha para dentro do absoluto.
Um dia, atrevi-me a ir ao escuro do escuro,
guiada apenas por sílabas perdidas, fragmentadas.
Já não me assusta o longe.
Daqui, vejo parte do todo
a caminho de paredes sem substância,
a desenhar semicírculos de socorro rente ao chão.
No horizonte, uma biblioteca
vigiada por um louva-a-deus,
imitando com precisão o delírio,
transformando o alimento em combate.
Ele vê víboras deslizando dos mastros das caravelas,
em línguas vazias,
corrompendo os livros futuros
com uma insanidade vulgar.
Os instrumentos atrás da cadeira são as maiores vítimas:
antevejo o som disforme dos corpos em colapso,
uma má convulsão fisiológica.
Esse inferno descontrolado prossegue
até o esgotamento da consciência,
despida de sentido.
Estou cansada da morte em todos os cantos,
do hálito sem vida,
do canto fingido amigo,
do amante sem amor,
do poeta parafraseado.
A morte não é mais um propósito,
mas o rastro perdulário de um diagnóstico narcísico.