Marias pairavam sobre as feiras, os pubs e os cabides de liquidação como pombinhas em penitência, orbitando um nada qualquer com a ilusão de liberdade. Ah, pobres Marias, que confundiam movimento com fuga, esquecimento com redenção. Como se o tempo, esse velho embusteiro de cartola puída, tivesse intenção de passar. Como se ele não se deliciasse em dobrar esquinas e dar de cara com o próprio rastro.
Cresciam, mas sem substância, sem peso. Cresciam apenas como cresce o eco numa sala vazia. Condenadas ao compasso morno de um dia que se repete, sem nunca se completar, deslizavam por entre suas rotinas como figurantes de um enredo sem autor. Amavam-se, porque era isso que as mocinhas bem-intencionadas deviam fazer, como se o mundo fosse um espelho mal polido, refletindo suas verdades sem contestá-las. Afinal, maridos, preconceitos e filhos estavam lá, mas quem disse que era papel delas questionar o imutável? Melhor bordar a resignação com fios de autoengano.
Vestiam-se de freiras, bruxas, Chanel — encharcadas em disfarces que apenas sofisticavam suas prisões.
A moda mudava, mas o olhar se mantinha imóvel, previsível, feito eco de anteontem. No fundo, o único luxo verdadeiro que se permitiam era uma ternura distraída por aquilo que temiam entender: o desconhecido.
Na praça, lá estavam elas, abraçadas umas nas outras, rumurosas certezas que nunca furavam a crosta do senso comum. E diziam, num suspiro trágico de quem descobriu o segredo do universo e não gostou:
— A verdade, Maria, mora exatamente onde minhas mãos não alcançam, onde meus olhos se perdem... Concordas?
— Ai, Jesus... Mas que nos poupe da revelação.
E o tempo, esse cafajeste incorrigível, dobrou-se sobre elas como um véu que encobre sem nunca revelar.