_frequento botequim_
Entra, senta, ajeita esse cangote e me escuta: a vida é simples, mas o homem, coitado, complica tudo com palavra de rascunho limpo demais. Enquanto uns tentam escrever poesia em livro encadernado e com dicionário no peito, eu já fui menina, mulher, senhora, homem e criança num mesmo dia – e cansei de medir abismos com palavras sem nunca ter pulado de verdade. Só que não: pulei.
Hoje, entre um gole de café forte e um risinho malandro, me pego lembrando de uns textos que chegaram perfumados de enciclopédia e alma de aeroporto. Bonitos, sim – mas cadê o chão batido? Cadê o grito que engasgou, a ferida que se recusa a ser exposta pra qualquer um? (Se não quer expor, é sinal de que és inteligente. Não sangre em tanque com tubarões.) Quem precisa de dicionário no peito, se o sonho é feito de pele suada e de respiração roubada pelo improviso?
Tem gente que vive declamando, como se o verbo fosse a última moda, mas sem ter aprendido que a palavra, quando demais, é só eco sem oxigênio. A gente, que já foi além do marasmo e do cálculo frio, sabe que o verdadeiro romance acontece na troca de fôlegos – quando um é o ar do outro, numa alternância gostosinha que não se ensaia em papel, mas se sente, com tudo, no peito, com todos os sentidos.
Enquanto uns medem o vão com tanta cautela que acabam se perdendo no silêncio, eu sigo por aí com meus tropeços e abraços próprios, rasgando o papel, a cortina, o currículo – tudo pra sentir a música que só a vida improvisada sabe tocar. E olha, pensar demais corta o compasso: a tradução literal da existência mata o mistério – igual barata e inseticida, sem nem dar o susto da verdade.
Tem gente que escreve como se tivesse acabado de sair de um palco montado, com sapato limpo e alma polida. Mas não. Aqui a gente pisa na grama, na lama e, depois, na merda – e volta todo sorrateiro pra contar a história com o humor ácido de quem já se abraçou com o caos. (Gentemmm, eu agarrei o Caos. Diliça!) A ferida é minha, e não está em exposição para qualquer um, porque viver é aprender a cuidar do que sangra sem precisar exibir cada cicatriz. Respeito e preservo o que amo.
Então, se você ainda tá tentando decifrar textos engessados e sem cheiro de rua, sugiro que se jogue na vida – com a ousadia de quem já experimentou todos os sabores e sabe que o amor verdadeiro é aquele que transpira junto, sem regras nem legenda. Sabe aquela vontade louca que você tem de mandar alguém tomar no céu do popoti? Então vai lá e manda. Fica doido. Vai devagar, que tô anotando tudo no guardanapo – e o roteiro da existência só se escreve com coração pulsante e alma de improviso.
E, se por acaso esse sopro te tocar, lembra: não é o texto bonito que faz o homem, mas o homem que, com um pé na bunda e o outro no ar, finalmente se transforma no verso que não se mede – no grito que se vive, sem medo de rasgar a verdade.
Escreva torto, escreva de viés, escreva atravessado.
Mas não deixe de escrever.
Perca o juízo, mas não perca o réu primário.
Já perdi os dois e ainda saí sorrindo:)
Já perdi os dois e ainda saí sorrindo:)
Nenhum comentário:
Postar um comentário